quinta-feira, 31 de março de 2011

Choveu hoje....


...denso e rápido.

A chuva até passou, mas o dia continua denso.
Pouco vento, muito sol, poucas nuvens, muita luz, pouca sombra.

"tá demorado hoje né?...

será que hoje acaba?

falta muito?

posso pular logo para amanhã a tarde?

não quero mais brincar de disso..."

Um gatinho caiu da árvore onde trelava por conta da chuva densa, do dia denso, do tempo denso... de patinha machucada... nem brinca mais o pobre gatinho. Mesmo assim, cuidado ao tentar tocar, mesmo que seja para ajudar, ele provavelmente vai te arranhar por se sentir acuado e triste... e denso.





ai meu ombro.


sexta-feira, 25 de março de 2011

Sextina da Vida Breve


,...


Em dias destes dias (muito em breve)
partirei sem remorso desta vida.
Quem sentir minha falta seja forte.
Sei que a terra em meu peito será leve
se pesada me soube a dura lida
e quem viveu no bem não teme a morte.

O que vida será? Que será a morte?
Que haverá que eu não saiba muito em breve?
A ciência dos homens, por mais lida,
não decifrou sentido nesta vida.
Toda a filosofia que se leve
do mundo vão, nada terá de forte.

Bandeiras coloridas nalgum forte
fremem sempre de vida. Mas a morte
há de vir mansamente, o passo leve,
lembrando o acidental da vida breve.
Pois só de brevidade vive a vida,
e de mágoa, de dor, de dura lida.

Quanto haverá de prêmio após a lida
a quem não se curvou, a quem foi forte?
Ou é pura ilusão o Mundo, a vida?
Ou é sono sem fim, nirvana, a morte?
Sonho a se esvanecer, fumaça breve
que o vento mais sutil num sopro leve?

Possa eu seguir no barco de alma leve
ganho o óbulo em suor, preço da lida.
(Não dure a travessia, seja breve).
Um copo cheio de bebida forte
ajudará a olhar de frente a Morte
como ajudou a olhar de frente a Vida.

Nunca houvesse rompido o ovo da vida
e não conheceria a dor. Mas leve
do que o ser é o não ser. A vida e a morte
são dois prismas iguais da humana lida.
Pois todo o que nasceu, ou fraco ou forte,
um só destino teve: a vida breve.

Tenha-se assim por leve a vida breve,
o espírito o mais forte em toda lida,
e se viva na vida amando a morte.

Edmir Domingues


*Sextina: Um poema que apresenta um dos sistemas estróficos mais difíceis e raros. Edmir Domingues foi um dos grandes poetas brasileiros que fez belíssimo uso da Sextina. ( http://pt.wikipedia.org/wiki/Sextina ). Tem por estrutura seis sextetos e um terceto final, a coda. Utilizando versos decassilábicos, tem as palavras (ou as rimas) finais repetidas em todas as estrofes, num esquema pré-determinado. Assim, as palavras (ou rimas) que aparecem na primeira estrofe, na seqüência de versos 1, 2, 3, 4, 5, 6, repetem-se na estrofe seguinte, na seqüência 6, 1, 5, 2, 4, 3. E se faz na estrofe seguinte a seqüência 6, 1, 5, 2, 4, 3 em relação à estrofe anterior. E assim até a sexta estrofe, finalizando os sextetos. O terceto final, ou coda, tem, em cada verso, no meio e no fim, marcando as sílabas tônicas, as palavras (ou rimas) utilizadas no poema todo, na posição em que se apresentaram na primeira estrofe.

Recomendo: DOMINGUES, EDMIR. Universo Fechado ou O Construtor de Catedrais. Recife: Bagaço, 1996.